Artigo publicado no jornal "A Folha da Manhã", Campos, no dia 30 de março de 2011, quarta-feira.
No processo que resultou na morte de Jesus, discute-se qual a acusação alegada pelos seus inimigos para arrancar a condenação do juiz romano Pôncio Pilatos. Em seu novo livro “Jesus de Nazaré” - II, o Papa trata dessa questão.
“S. João relata a conversação entre Jesus e Pilatos, em que a pergunta sobre a realeza de Jesus, o motivo de sua morte, é explorada em profundidade (18, 33-38)... Com afiada perspicácia, ele escolheu como chave da narrativa da paixão a realeza de Jesus e fez seu significado mais claro, talvez, do que qualquer outro escritor do Novo Testamento”.
“O peso da afirmação de Jesus em ser rei dos judeus era muito grave. Roma não tinha qualquer dificuldade em reconhecer reis regionais como Herodes, mas eles tiveram que ser legitimados por Roma e tiveram que receber de Roma a definição e a limitação da sua soberania. Um rei sem tal legitimação era um rebelde que ameaçava a Pax Romana e, portanto, tinha de ser condenado à morte. Pilatos sabia, no entanto, que nenhuma revolta rebelde tinha sido instigada por Jesus. Tudo o que tinha ouvido sobre ele deve ter feito Jesus parecer-lhe como um fanático religioso, que pode ter ofendido algumas decisões legais e religiosas judaicas, mas que não era motivo de qualquer preocupação para ele. Os judeus mesmos deveriam julgá-lo. Do ponto de vista da ordem jurídica e política romana, que se inscrevem no âmbito de sua competência, não havia nada de grave para sustentar contra Jesus”.
“Durante o interrogatório, de repente, chegamos a um momento dramático: a confissão de Jesus. À pergunta de Pilatos: ‘Então você é um rei?’, ele responde: ‘tu o dizes: eu sou um rei. Para isso nasci, e por isso vim ao mundo, para dar testemunho da verdade. Quem é da verdade ouve a minha voz’. Anteriormente Jesus dissera: ‘meu Reino não é deste mundo; se minha realeza fosse deste mundo, meus servos lutariam para que eu não fosse entregue aos judeus; mas a minha realeza não é desse mundo’. Esta ‘confissão’ de Jesus coloca Pilatos numa situação extraordinária: o acusado alega realeza e um Reino. No entanto ele sublinha a diferença completa de sua realeza, e ele mesmo ressalta o ponto específico que deve ter sido decisivo para o juiz romano: ninguém está lutando por esta realeza. Se o poder, poder militar verdadeiro, é característica da realeza e de reinos, não há nenhum sinal disso no caso de Jesus. E também não há qualquer ameaça à ordem romana. Este Reino é impotente. Ele não tem legiões”.
“No entanto, Pilatos também parece ter experimentado uma certa cautela supersticiosa com relação a esta figura notável: talvez realmente houvesse algo divino neste homem. ... Os acusadores de Jesus, obviamente, percebem isso. Contra o medo supersticioso de uma eventual presença divina, apelam para o medo totalmente prático de perder o favor do imperador, sendo removido do cargo e assim mergulhar em uma espiral descendente. A declaração: "Se você liberar este homem, você não é amigo de César" (Jo 12, 19) é uma ameaça. No final, a preocupação com a carreira se revela mais forte do que o medo de poderes divinos”.
Dom Fernando Arêas Rifan
Bisbo Titular de Cedamusa
Administrador Apostólico da Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney
Fonte: Adapostólica
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