Artigo publicado no jornal "A Folha da Manhã", Campos, no dia 6 de abril de 2011, quarta-feira.
Na leitura do novo livro do Papa, “Jesus de Nazaré” - II, vimos, em nosso último artigo, que a “causa mortis” de Cristo, segundo alegaram seus inimigos e impressionou Pilatos, foi a sua “realeza”. E Jesus explicou bem que essa sua realeza não era desse mundo, que ele não tinha “legiões” em sua defesa. Ela não perturbaria a realeza dos césares romanos. Mas qual era a característica desta sua realeza?
Com a explicação que deu sobre o “seu reino”, “Jesus criou um conceito completamente novo de realeza e reino, que surpreendeu Pilatos, o representante do poder mundano clássico. Qual a importância que Pilatos deveria dar a isso, e que nós devemos dar: este conceito de Reino e de realeza? É irreal, é pura fantasia que pode ser ignorada com segurança? Ou isso nos afeta de alguma forma?”
“Além da delimitação clara de seu conceito do Reino (sem luta, impotência terrena), Jesus introduziu uma idéia positiva, para explicar a natureza e o caráter específico do poder dessa realeza: ou seja, a verdade. Como prosseguiu o diálogo, Pilatos põe em jogo outra idéia que veio de seu mundo e normalmente estava ligado com o ‘Reino’: ou seja, poder-autoridade (exousía). Domínio demandava poder; é a sua definição. Jesus, no entanto, define como a essência da sua realeza o testemunho da verdade. É a verdade uma categoria política? Ou o Reino de Jesus não tem nada a ver com política? A que ordem ele pertence? Se Jesus baseia seu conceito de realeza e Reino na verdade como categoria fundamental, então é totalmente compreensível que o pragmático Pilatos lhe pergunte: ‘O que é a verdade’? (Jo 18, 38)”.
“É a pergunta que é feita também pela teoria política moderna: política pode aceitar a verdade como uma categoria estrutural? Ou a verdade, como algo inatingível, deve ser relegada para a esfera subjetiva, tendo seu lugar tomado por uma tentativa de construir a paz e a justiça usando quaisquer instrumentos que estejam disponíveis ao poder? Baseando-se na verdade, a política, em virtude da impossibilidade de alcançar um consenso sobre a verdade, não se faz a si mesma uma ferramenta de tradições particulares que, na realidade, são apenas formas de aferrar-se ao poder?”
“E ainda, por outro lado, o que acontece quando a verdade não conta nada? Que tipo de Justiça é então possível? Não haveria critérios comuns que garantam a verdadeira justiça para todos — critérios que são independentes da arbitrariedade das variações de opiniões e poderosos lobbies? Não é verdade que as grandes ditaduras foram alimentadas pelo poder da mentira ideológica e que só a verdade foi capaz de trazer liberdade?”
No mundo de hoje, em que reina o relativismo, onde não há verdade objetiva mas cada qual quer possuir a “sua verdade”, onde as afirmações contraditórias podem ser ao mesmo tempo verdadeiras, onde impera o subjetivismo contra a objetividade da verdade, então, mais do que nunca, é necessário ouvirmos esse Rei que veio ao mundo trazer a verdade.
Dom Fernando Arêas Rifan
Bisbo Titular de Cedamusa
Administrador Apostólico da Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney
Fonte: Adapostólica
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