sábado, 24 de março de 2012

Sucessão no Reino da Infâmia

Sucessão no Reino da Infâmia


27/2/2012

Valdis Grinsteins

Era uma vez um país cujo poder era transmitido de pai para filho de uma mesma família, a qual mantinha seus súditos na mais espantosa miséria através de sangrenta tirania. Enquanto o governante desfrutava das mais requintadas gastronomias, de exuberante luxo e viajava levando centenas de garrafas de vinhos raros,1 a população morria de fome aos milhões.2 Às vezes o tirano começava a comer à meia-noite e só terminava ao amanhecer, 3 enquanto as crianças pobres comiam cachorros mortos e carne podre.4 Pior ainda, o tirano se julgava dono da verdade e todos deviam crer firmemente na sua religião, sob pena de execução de toda a família do culpado. Ele decidia desde o tipo de roupa que os adultos podiam usar, aos lugares em que eles podiam ir e o que podiam ver. O absurdo chegou a ponto de não ser permitido aos anões viver na capital de seu Reino, para não causarem má impressão estética.5 Um regime abominável e antinatural, não é verdade?


Onde tais horrores ocorrem?

Algum leitor influenciado pelas detrações e falsidades da “legenda negra” talvez tenha pensado que tais absurdos aconteceram em algum país católico acusado pela imprensa e pela literatura laica e agnóstica de “medieval”, “dominado pela Inquisição” e por um monarca tirano. Não. Não se trata nem da França do século XII nem da Espanha do século XVI... Todos os horrores citados ocorreram e continuam a acontecer na Coréia do Norte comunista de nossos dias.

Com a morte do ditador Kim Jong-il, esse país ocupou lugar de destaque em todos os jornais do mundo, que apresentaram cenas de pessoas “chorando” aquela morte. Ai daqueles que não chorassem — ao menos como carpideiras — pois poderiam ser severamente castigados! Diante da enorme quantidade de absurdos e mentiras que acontecem diariamente naquela ditadura, é raro um artigo de jornal que não comente um, dois ou mais casos chocantes.

Que a mentira seja apanágio dos comunistas, todos o sabem. O que as pessoas parecem desconhecer é até que ponto eles mentem e como os regimes comunistas não reduzem à mentira, sem nada de positivo. Não é que eles desejam algo de bom e que por equívoco resulta em mal. Não. É o mal deliberado, a infâmia, o crime e a mentira que são institucionalizados.

Para começar, os comunistas odeiam a família tradicional. A Rússia foi o primeiro país do mundo a permitir o amor livre. O marido podia ser mandado trabalhar numa cidade e a esposa em outra. Apesar de odiar também a instituição familiar, a estabilidade da ditadura norte-coreana está baseada na família...

Ao criticarem o novo ditador norte-coreano porque não houve sucessão democrática, muitos jornais “se esquecem” de apontar a contradição solar: destruir a instituição da família e manter a estabilidade do Estado através da hereditariedade familiar. O regime norte-coreano tampouco é de tipo constitucional como os do Ocidente, em que o papel do chefe de Estado ou é apenas protocolar, ou é limitado por uma Constituição. Não. O chefe de Estado ali tem poder absoluto, exercido por um ditador que dispõe discricionariamente até mesmo da vida dos 23 milhões de seus desditosos súditos.
Culto obrigatório ao ditador

Nunca na História algum regime político prometeu tanta liberdade como os regimes marxistas. Contudo, a tirania norte-coreana chega ao extremo de decidir não apenas sobre o modo de as pessoas se vestirem, mas até que músicas elas devem ou não ouvir. Por exemplo, composições de Mozart, Beethoven e Chopin estão proibidas na Coréia do Norte.6 Para reforçar a propaganda, a tirania instalou alto-falantes por todos os lados, especialmente nos cruzamentos de ruas e parques, usando-os até para despertar as pessoas.7 Eles existem até mesmo dentro das casas,8 para obrigar a população a ouvir as notícias oficiais.

No universo comunista abundam o ridículo e a contradição. Na Coréia do Norte eles chegam ao clímax quanto ao culto à personalidade do ditador e de seu pai. Segundo a biografia oficial de Kim Jong-il, ele aprendeu a andar na terceira semana, a falar na oitava,9 e teria escrito 1500 livros durante seus estudos universitários. As crianças norte-coreanas não celebram o próprio aniversário, mas os de Kim il-sung e Kim Jong-il,10 sendo todos os cidadãos obrigados a chamar seus ditadores de “patriota inigualável”, “pensador engenhoso”, “sol da nação”, “sol vermelho dos oprimidos do mundo”.11 O Partido Comunista distribui à população retratos dos ditadores e um paninho branco para limpá-los, o qual deve ser guardado dentro de uma caixinha. Uma vez por mês a polícia averigua o estado de limpeza dos retratos.12 As pessoas são obrigadas a se prostrar até 50 vezes por dia diante dos retratos ou das estátuas dos retratados.13 Existem no país cerca de 34 mil estátuas de Kim il-sung.14
Kim Jong-Um (esq.) promete continuar a obra nefasta de seu pai Kim Jong-il (dir.)

Fome, prisões e execuções


Existem no país cerca de 34 mil estátuas de Kim il-sung

São inúmeros e bem documentados os relatos sobre a fome crônica reinante nesse escravizado país. Ela é tão grande que as pessoas comem tudo quanto se move, sendo necessários até dois anos para que a vida animal se recupere um pouco após elas terem passado por determinado lugar.15 Os campos são pastos e não bosques, porque estes quase não existem, de tal modo foram devastados. A madeira é utilizada na cozinha e para aquecer as casas.

Cifras espantosas da Coréia do Norte: 400 mil pessoas mortas em prisões nos últimos 30 anos16 e mais de 200 mil homens, mulheres e até crianças mantidos em campos de concentração.17

Como sempre, há ingênuos esperando que a recente substituição do ditador por seu filho, o gorducho Kim Jong-Um, venha a provocar uma mudança no sistema. Apesar de King Jong-il ter negado taxativamente essa hipótese, tais ingênuos parecem nada ter aprendido com a transferência de poder ocorrida em Cuba, de Fidel Castro para seu irmão Raul Castro. Não nos iludamos: houve uma sucessão no Reino da infâmia e do crime, a qual não cessará enquanto houver regimes marxistas estruturados com base na negação da Lei divina e da Lei natural.

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Notas:
1. Cfr. “La Nación”, Buenos Aires, 20-12-11.
2. Cfr. “El País”, Madrid, 20-12-11.
3. Cfr. “La Nación”, 20-12-11.
4. Cfr. “The Economist”, Londres, 17-9-11.
5. Cfr. Barbara Demick, Per mano nel buio, Ed. Piemme, Milão, 2010, p. 171.
6. Cfr. This is paradise! Hyok Kang, Ed. Abacus, Londres, 2007, p. 46.
7. Cfr. “El Mundo”, Madrid, 20-12-11.
8. Cfr. This is paradise! Hyok Kang, Ed. Abacus, Londres, 2007, p. 3.
9. Cfr. “The Telegraph”, UK, 31-1-11.
10. Cfr. Barbara Demick, Per mano nel buio, Ed. Piemme, 2010, p. 69.
11. Cfr. Marcelo Abreu, Viva o grande líder! 1ª edición, Geração Editorial, São Paulo, 2002, p.37.
12. Cfr. Barbara Demick, Per mano nel buio, Ed. Piemme, 2010, p. 68.
13. Cfr. “El Mundo”, 20-12-11.
14. Cfr. “Le Monde”, Paris, 19-12-11.
15. Cfr. “The aquariums of Pyongyang”, Kang Chol-Hwan, Ed. Atlantic books, Londres, p. 104.
16. Cfr. “El País”, 20-12-11.
17. Cfr. “Dailymail”, UK, 20-9-11.

Veja:
Revista Catolicismo
Fonte: Fundadores

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