Um Conto de Natal: Alma aflita, parte 2
Do fundo dos anos de indiferença, as palavras esquecidas há tanto tempo foram pouco a pouco emergindo em sua memória:
Lembrai-Vos, ó piíssima Virgem Maria, que nunca se ouviu dizer que algum daqueles que tenha recorrido à vossa proteção, implorado vossa assistência, reclamado vosso socorro, fosse por Vós desamparado.
Animado eu, pois, com igual confiança, a Vós, ó Virgem entre todas singular, como a Mãe recorro, de Vós me valho, e gemendo sob o peso de meus pecados, me prostro a vossos pés.
Não desprezeis as minhas súplicas, ó Mãe do Verbo de Deus humanado, mas dignai-vos de as ouvir propícia e de me alcançar o que Vos rogo. Assim seja.
Num primeiro movimento de orgulho amargo, a alma se perguntou: Serei eu a primeira a dizer que Nossa Senhora não veio em meu socorro? Depois percebeu claramente que não havia se dado ao trabalho de pedir uma só vez esse socorro...
E caminhando por ruas vazias e frias, ela repetia as palavras da oração de sua infância: Gemendo sob o peso de meus pecados [...] nunca se ouviu dizer que algum daqueles que tenha recorrido à vossa proteção [...] fosse por Vós desamparado! Animado eu, pois, com igual confiança [...] como a Mãe recorro, de Vós me valho...
Uma grande dor invadiu então essa alma atormentada, ao tomar consciência do lamentável estado em que se encontrava. Do mais fundo de seu ser, subia-lhe um desejo de reconquistar a amizade de Deus e os perfumes primaveris de sua vida espiritual, de restaurar a inocência perdida.
— Será ainda possível? –– perguntava-se ela.
— Nunca se ouviu dizer... –– respondia-lhe uma voz interior.
Movida pela graça, repetiu ainda, com toda sinceridade, as palavras do Lembrai-Vos e pediu a Nossa Senhora que viesse em seu socorro.
— Vamos ver o que sucederá –– pensou ela com uma ponta de incredulidade. E virou a esquina.
* * *
A luz interior da igreja iluminava os vitrais. A porta estava aberta. Hesitante e surpresa, entrou. Estava para começar a vigília de Natal. Pela nave lateral, avançou até o altar de Nossa Senhora.
Uma melodia natalina partiu do órgão. A alma desmanchou-se em prantos. Depois de tantos anos de secura no egoísmo, ela se afogava em soluços de arrependimento.
As lágrimas escorriam-lhe pela face em abundância, e seu tronco sacudia ao ritmo convulsivo do pranto em soluços, como o de uma criança...
Lá havia um padre para ouvir confissões. E este não foi o menor dos milagres, para os tempos em que vivemos. A alma foi acusar-se como pôde, um tanto confusamente, de sua triste vida afastada de Deus. E recebeu a absolvição de suas faltas.
* * *
Deixo ao leitor o cuidado de pensar na alegria que, naquela noite, causou ao Coração de Jesus Infante a volta ao rebanho de sua pequena ovelha transviada.
O Menino Jesus veio sobretudo para os pecadores. Não recusa jamais o seu perdão. Acolhe com bondade e misericórdia toda humilde contrição. Ontem, hoje, sempre, Jesus Cristo é a solução para o mundo, que afunda na noite do neopaganismo.
No maior drama de nossa vida, recorramos com confiança a nosso Salvador, por intermédio da Santíssima Virgem, a quem Ele nada recusa.
(Por Benoît Bemelmans, extraído de Catolicismo)
Fonte: Fátima em Foco On-line
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