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domingo, 22 de junho de 2014

O sofrimento

Texto do Professor José Luiz Delgado publicado no Jornal do Commercio (Recife, 11 de março de 2014 – foram feitas pequenas modificações estilísticas):
A vida pode ser uma sucessão de alegrias, de realizações, de vitórias. Mas será também uma sucessão de sofrimentos e agonias, umas maiores e outras menores, nuns mais e noutros menos. Por que alguns homens sofrem tanto? Por que sobre determinados membros da da família humana, e não sobre outros, e não sobre todos, se abatem certas moléstias ou certas privações que lhes prejudicam terrivelmente a qualidade de vida? Não há regra nessas fatalidades: não são sempre os piores que sofrem, nem os melhores. Nem aqueles, com tais sofrimentos, são castigados; nem estes são purificados e exaltados como que para dar exemplo. A vida é desigual também nisso: no fato de recair sobre uns uma carga excessiva de sofrimentos, enquanto outros são olimpicamente poupados.
O sofrimento é um mal, evidentemente. Desde os primeiros albores da consciência até o último estertor, o homem é perturbado, impressionado, obcecado, com a presença do mal. Não só o mal moral, a escolha voluntária do mal, a opção pelo crime e pelo pecado. Mas, antes de tudo, o mal físico, a dor, o sofrimento, o mal que atinge os inocentes (ao menos, inocentes do mal que os toca).
O mistério do mal seria ainda mais incompreensível se bens muito maiores não pudessem ser tirados dele. Nem sempre se tira, é fato. Mas, quando alguém, a quem foi dada carga muito pesada de sofrimentos, em vez de se revoltar contra o destino, aceita, resignado, a humilhação de sua carne e consegue tirar das dores que o acometem, um bem ainda maior, não somente fica pessoalmente pacificado, sobretudo dá admiráveis lições diárias, edificantes exemplos, reanimadoras motivações, e será exaltado entre as melhores referências da fortaleza humana. Se, ao invés, do próprio sofrimento não conseguir extrair as consolações e as grandezas que poderia tirar, contará com uma compreensão que não terão aqueles que foram poupados de sofrimentos semelhantes.
Não sei se pode imaginar algum consolo para esses sofredores, que dizem ser os preferidos de Deus, e que, tendo já padecido demais aqui, hão de chegar mais rápido à felicidade da outra vida. Sei é que são exemplares e são queridos exatamente pela imensidão de sua dor. E ainda nos mostram como somos todos humanos, tão frágeis, tão vulneráveis, tão dependentes de um milhão de coincidências para continuarmos nesta existência.
 

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

O sofrimento não é criação divina

O sofrimento não é criação divina


Deus, que é Amor, fonte e origem de toda a bondade, beleza e perfeição, criou-nos à Sua imagem
e semelhança. Fomos criados por amor e para a felicidade. Como pois compreender a origem do sofrimento, a que Jó se refere tão dramaticamente na primeira Leitura da Missa de hoje, e que a todos atinge?
Deus, na Sua bondade, quis criar-nos livres e como tais, conscientes.
Os nossos primeiros pais envaidecidos com os dotes maravilhosos que possuíam, não souberam usar a liberdade que Deus, tão generosamente lhes tinha concedido. Obcecados pelo orgulho, duvidaram da Bondade e do Amor do Criador. Por momentos acreditaram mais no demônio, pai da mentira. Esta opção voluntária, afastou-os de Deus e, consequentemente, da verdadeira felicidade. Longe dessa fonte bendita, quantas lágrimas se derramaram, quanto sangue fratricida se verteu, quantas guerras, quanto sofrimento, quanto atraso social aconteceu, ao longo dos séculos!
Não há dúvida. O sofrimento foi e continua a ser causado, pelos passos errados, percorridos voluntária, orgulhosa e cegamente pelos homens. Só o homem é verdadeiramente causador de tanta desgraça.
O pecado é uma ofensa a Deus, revelando pouca ou nenhuma confiança no Senhor. E como a gravidade de qualquer ofensa se mede pela pessoa ofendida e aqui o atingido é o próprio Deus, o onipotente, o infinito, logo a sua gravidade se reveste de algo com dimensões infinitas também.
O mais dramático ainda é que a reparação de tanta maldade, não estava dentro das possibilidades humanas, pois, por maiores que tais pudessem ser, porque humanas, eram sempre limitadas, ficavam muito aquém do que a justiça divina, como tal, exige. Só um Deus pode reparar o mesmo Deus. Por isso, Deus-Pai, envia à Terra, o Seu Filho, o Verbo eterno, permitindo a Sua encarnação no Ventre Puríssimo de Nossa Senhora, para se fazer Homem também. Jesus, filho da Virgem Maria é assim Deus e Homem verdadeiro, e como tal, em nosso nome, satisfez com a Sua paixão e morte na cruz, pelos pecados de toda a humanidade.
Vemos assim que a gravidade do pecado, não se mede só pelo sofrimento causado nos homens, ao longo dos séculos, mas mais ainda pela impensável humilhação da encarnação, paixão e morte do próprio Filho de Deus.
Conhecedores de tão trágicas consequências do pecado, resta-nos estar vigilantes, como Jesus insistentemente nos pediu, para fugir dos caminhos errados da vida. Tais caminhos nefastos, são todos aqueles que estão contra a vontade do Senhor, expressa nos Seus mandamentos e impressa na consciência retamente formada, de cada um.
Como S. Paulo, não podemos ficar indiferentes, diante de tais dramas, vividos e provocados pelos pecados dos homens. «Ai de mim se não anunciar o Evangelho!» «Anunciar o Evangelho não é para mim um título de glória, é uma obrigação que me foi imposta». «Livre como sou em relação a todos, de todos me fiz escravo, para ganhar o maior número possível». Assim se expressa o Apóstolo.
As injustiças sociais, os caminhos errados que levam tantos jovens e adultos, percorrendo vidas dissolutas, as uniões de fato, as infidelidades conjugais, a não aceitação dos filhos, o recurso a meios anticonceptivos artificiais, o crime hediondo do aborto, os filmes, revistas e jornais indecorosos, são outros tantos caminhos errados causadores de lágrimas, sofrimento e retrocesso social.
Quando os homens se afastam dos caminhos do Evangelho e do Magistério autêntico da Igreja fundada por Jesus, perdem facilmente a luz da fé, e, sem essa luz bendita, enveredam pela noite do egoísmo, da autodestruição. Pobre mundo, se não acorda para Deus, que o pode e quer salvar!
No Evangelho, vemos Jesus a curar e a apontar caminhos que importa saibamos também percorrer para sermos instrumentos válidos de curas também. Jesus aproxima-se da sogra de Pedro e cura-a. Como Ele, também nos devemos saber aproximar de quem sofre e de quem anda longe dos caminhos da verdadeira felicidade. Muitas conversões passam por uma conversa pessoal, amiga, compreensiva, fraterna, com quem de tal atenção, carinho e ajuda, está a precisar.
Depois de tantas curas operadas, Jesus, naquela tarde, afasta-se para orar. É à oração que todos podemos e devemos constantemente recorrer. Na oração, que nos leva a um contato mais íntimo com o Senhor, compreenderemos melhor o porquê do sofrimento, o seu valor corredentor, e os caminhos que devemos seguir para a conversão dos pecadores, nossos irmãos.
Perante tanto sofrimento e tanto pecado, não podemos ficar indiferentes. Que o Senhor nos dê a graça de sermos instrumentos válidos de conversão, para que todos, sem exceção, definitivamente possam «louvar o Senhor que salva os corações atribulados.»
Fonte: Encontro com o Bispo

domingo, 22 de janeiro de 2012

Reconstruir e recomeçar

Reconstruir e recomeçar

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo de Belo Horizonte (MG)

As catástrofes causadas pelas chuvas geram sofrimentos que cortam o coração. Compartilhar a dor de sonhos desfeitos, a desolação da perda do que se conquistou com suor e sacrifícios, o sentimento de abandono e impotência, desafiam o coração, a vida, a cidadania. Não é um compartilhamento fácil.

A reação primeira aparece nos gestos de solidariedade que minimizam esses sofrimentos e a penúria da falta de alimentos, roupas, moradias. Consola o coração quando avaliamos, entre outras iniciativas cidadãs e de fé, o empenho do Vicariato Episcopal para Ação Social e Política, da Arquidiocese de Belo Horizonte. Um trabalho que mobiliza muitas pessoas e conta com a capilaridade de sua rede de comunidades nas paróquias para fazer chegar os primeiros socorros – um verdadeiro testemunho de fé e solidariedade.

A situação cria oportunidade para um olhar clarividente e gestos solidários por parte de todos que podem e devem ajudar os que estão em situação de extrema precisão. É um momento em que não é permitido ficar de longe, de braços cruzados, desfrutando do conforto e da felicidade de não ter sido atingido pelos males causados pelas chuvas. Esta solidariedade tem que conectar a cidadania à compreensão de que a intervenção do poder público, particularmente em âmbito federal, não pode ser considerada como uma ajuda circunstancial e numericamente insignificante diante das necessidades e urgências. Trata-se de uma obrigação e um dever que, na verdade, devem ser cumpridos com ações de prevenção e rapidez em investimentos de infraestrutura, para evitar as surpresas que chegam desmoronando tudo por conta das indicadas e listadas fragilidades.

Esta compreensão situa a cidadania num lugar diferente daquele de se tratar o povo como “ajudados em emergência” para se alcançar e efetivar um entendimento que urge um tratamento diferente. Isto é, um tratamento que define diferentemente as prioridades, premie a capacidade inventiva de quem trabalha, governa e serve. De modo especial, produza e sustente uma cidadania que não fique atrelada e dependente de favores, refém de configurações cartoriais. Que vá além, e ultrapasse o limite próprio e evidente que está na ideologia do partido, que por si é apenas, embora necessário, uma parte.

Esse horizonte, com mais de 180 municípios mineiros em estado de emergência e mais de 60 mil pessoas desalojadas, tendo bem em mente o sacrifício de famílias inteiras e de cada pessoa, nos leva a pensar no longo caminho a ser percorrido, com a reconstrução de casas, ruas, pontes, estradas e outras muitas demandas. Ainda que o tempo tenha melhorado, o comprimento desse caminho não fica encurtado. É preciso lembrar que as necessidades demandam urgências em procedimentos e execuções.

Um desafio enorme para uma sociedade que sabe criar burocracias e tem grande dificuldade de estabelecer rapidez, com eficiência, no atendimento de necessidades e mesmo nos avanços em vista de progressos e do desenvolvimento integral. Esse caminho longo, por si só exigente, é um grito a céu aberto para que as providências sejam tomadas com velocidade para que a vida de tantos volte ao normal e seja como ela deve ser. Há de se incluir, nessa labuta que as chuvas colocaram como desafio, a compreensão de que é hora e oportunidade para recomeçar. Reiniciar, em primeiro lugar, sob o signo da solidariedade, do respeito e do amor, proporcionando a toda a família e, na sociedade, diálogos e discussão dos problemas pensando uma compreensão e vivência cidadãs diferentes e qualificadas. Esse é o ponto de partida insubstituível: a configuração permanente de um humanismo que deve contar com a força da cultura e de seus próprios valores. Imprescindível, pois é preciso aprender com as lições dos sofrimentos. Aproveitar para adotar novos estilos de vida e mudar mentalidades. Mudanças para se buscar o verdadeiro, o belo, o bom e a comunhão cidadã para bem se determinar as opções de consumo, de poupança e de investimentos.

Assim, o caminho da reconstrução, inevitável e inadiável, se torne uma exigência e um imperativo para que se compreenda a cidadania como serviço à pessoa, à cultura, à economia e à política. Determinante seja a política e a atuação dos políticos, em interface indispensável e compreendida como o segredo do êxito, com os outros segmentos da sociedade, alavancados pelo privilégio da rica cultura que subsidia essa história e esse povo tão importantes no cenário nacional.

A reconstrução é uma oportunidade de recomeçar para se ocupar, social e politicamente, o lugar devido que Minas e seu povo merecem.

Fonte: CNBB