Artigo publicado no jornal "A Folha da Manhã", Campos, no dia 20 de abril de 2011, quarta-feira.
No drama da Paixão de Jesus, aparece essa figura, que passou à história como o exemplo de juiz astuto, manobreiro, indeciso entre a verdade e o interesse próprio: Pôncio Pilatos, o governador Romano a quem foi apresentado um réu inocente. Interessante a análise dessa figura feita por Bento XVI no livro “Jesus de Nazaré II”.
“A imagem de Pilatos nos evangelhos apresenta o governador romano bastante realisticamente como um homem que poderia ser brutal quando julgasse que isso interessaria à ordem pública. Mas ele também sabia que Roma devia sua dominação do mundo à sua tolerância de divindades estrangeiras e à capacidade do direito romano para construir a paz. Assim nos é apresentado Pilatos durante o julgamento de Jesus”.
“Em João 18, 34-35, fica claro que, com base nas informações que possuia, Pilatos nada tinha que pudesse incriminar Jesus e constituir um risco para a lei e a ordem. A acusação vinha do próprio povo de Jesus, das autoridades do tm6emplo”.
Quando Pilatos ouviu a ameaça de que ele poderia perder o seu cargo se não condenasse Jesus, que se proclamava rei, a preocupação com a sua carreira se revelou mais forte do que qualquer escrúpulo de consciência. Mas Pilatos ainda tentou alguns expedientes. Apresentou Jesus como um candidato à anistia da Páscoa, buscando libertá-lo. “Ao fazê-lo, ele se coloca em uma situação fatal. Qualquer pessoa apresentada como um candidato à anistia é em princípio já condenada”. Em seguida, Pilatos mandou flagelar Jesus, que ele proclamara inocente. Ele contava erradamente com a compaixão dos acusadores. Mas, no direito penal Romano, a flagelação era a punição que acompanhava a sentença de morte, que, por fim, ele pronunciou.
Embora tivesse declarado Jesus inocente – essa verdade ele sabia -, “a grande ‘Verdade’ de que Jesus tinha falado ficou inacessível a Pilatos. Ou seja, no final das contas, o conceito pragmático, a solução prática, prevaleceu, sendo, para ele, mais importante do que a verdade.
Quando Jesus afirmou diante dele que era rei e que veio ao mundo para dar testemunho da verdade, Pilatos lhe perguntou: “o que é a verdade?” E saiu, sem esperar a resposta. “Pilatos não estava sozinho em afastar esta pergunta como irrespondível e irrelevante para seus propósitos. Também hoje, em assunto político e na discussão dos fundamentos da lei, ela geralmente é experientada como perturbadora. Se o homem vive sem verdade, a vida fica sem sentido para ele. Finalmente ele se entrega a quem é o mais forte. ‘Redenção’, no pleno sentido da palavra, somente pode consistir em que a verdade se torne reconhecível. E ela se torna reconhecível quando Deus se torna reconhecível. Ela se torna reconhecível em Jesus Cristo. Em Cristo, Deus entrou no mundo e colocou o critério da verdade no meio da história. Exteriormente, a verdade é impotente no mundo, assim como Cristo, pela visão do mundo, é impotente: ele não tem legiões. Ele é crucificado. Mas precisamente assim, em sua própria impotência, ele é poderoso: só assim a verdade se converte de novo em poder”.
Dom Fernando Arêas Rifan
Bisbo Titular de Cedamusa
Administrador Apostólico da Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney
Fonte: Adapostólica
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