O problema da co-educação: as escolas mistas, sistema de ensino que a Igreja sempre recusou
17 ago 2011 5 Comentários
por lucianalachance em família Tags:educação, filhos, pais
Por Vladimir Lachance
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Por co-educação se entende a educação de meninos e meninas feita em comum, modelo que domina a maior parte das escolas do Brasil e do mundo.
Apesar de dominante, este modelo educacional só se estabeleceu no último século: pouco a pouco foi substituindo as escolas não-mistas, até que, por volta da década de 70, se tornou o modelo normal de educação, enquanto que as escolas que educavam apenas um dos sexos foram desaparecendo, à força da pressão feita pelos órgãos de educação do país – e em parte também pela mudança de mentalidades da sociedade em geral.
Então, o que para nós parece algo comum na verdade não o foi. Até o século XIX a influência da Igreja sobre a educação ainda se fazia presente de algum modo, preservando o princípio de que a educação deveria ser diferenciada para cada sexo. Mas, neste mesmo século, as vozes incorfomadas com os ideais católicos já começam a se fazer ouvir: eis que a propaganda pela co-educação aparece.
De 1882 a 1884 ocorreu o “Congresso de Instrução” no Rio de Janeiro. Embebido da influência pseudo-científica do Positivismo, este congresso abordou questões avançadas para a época, como a “liberdade de ensino”, o “ensino obrigatório” e a “organização do ensino secundário feminino”. Além disto, nos parece interessante destacar neste Congresso o parecer dado pelo Inspetor da Instrução Pública do Rio de Janeiro, Dr. João Barbalho Uchôa, que levanta inúmeros argumentos em favor da co-educação – que constituem praticamente os mesmos argumentos utilizados pelos propugnadores da co-educação atualmente, por isso vemos a necessidade de analisá-los. Os seus argumentos se resumem a:
1. [...] a influencia irrecusavel que o ensino mixto produz com relação aos costumes e maneiras, contribuindo de modo muito decisivo para ameniza-los. Como é, porém, que se apparece esse estimulo, e como se dá essa amenização. É simples, e facilmente se comprhende. As alumnas pretendem não se mostrar inferiores em aproveitamento aos alumnos, e por sua parte estes não querem deixar-se vencer por ellas. Resultado: mais applicação; mais assiduidade; melhores lições; maior proveito e adiantamento (CONGRESSO DE INSTRUÇÃO 1882-1884, item I).
Para fazer este primeiro ponto funcionar, o Inspetor então saca do segundo argumento – introdução de mulheres no quadro de professores, para amenizar a dificuldade das meninas em aceitar a presença de meninos na classe; a professora funcionaria como mediadora das duas partes:
2. Sabe-se que a mulher tem mais facilidade, mais jeito de transmittir nos meninos os conhecimentos que lhes devem ser communicados. Maneiras menos rudes e seccas, mais affaveis e attrahentes que os mestres, aos quaes incontestavelemnte vence em paciência, doçura e bondade. Nella predominam os instinctos maternaes, e ninguém como ella possue o segredo de captivar a attenção de seus travessos e inquietos ouvintes, sabendo conseguir que as lições, em vez de tarefa aborrecida, tornem-se-lhes como uma diversão, um brinco (CONGRESSO DE INSTRUÇÃO 1882-1884, item II).
3. Assim educados, elles sahem da escola com a profunda imprensao que ahi receberam e serão homens attenciosos, cheios de acatamento para com as senhoras, e de costumes que honram a sua educação (CONGRESSO DE INSTRUÇÃO 1882-1884, item II).
4. Em vez de dous mestres, duas escolas, duas casas [...], uma aula mixta presta o mesmo e melhor serviço: e com a quantia poupada da creação e custeio, que assim se tornam desnecessários, de mais outra escola, proporcionam-se os meios para em outro lugar terem os meninos o preciso ensino (CONGRESSO DE INSTRUÇÃO 1882-1884, item V).
5. O preconceito e prevenção tem de ceder à experiência e ao tempo, que os hão de vencer, atestando mais tarde, com os factos, não serem razoáveis os receios dos que levam tão longe seus escrúpulos para condemnar, por uma preoccupação que os domina, providencia de vantagens não duvidosas. (CONGRESSO DE INSTRUÇÃO 1882-1884, item VIII). (1)
Vejamos agora, pois, qual o argumento moral defendido pela Igreja, para em seguida examinar mais detidamente os itens elencados pelo Inspetor Dr. Uchôa.
Posicionamento da Igreja quanto à co-educação
Iniciemos com as palavras do Magistério de Pio XI, na encíclica Divini Illius Magistri – de 1929, que repete o ensinamento perene da Igreja na matéria da educação. Eis as palavras do Papa:
“D) COEDUCAÇÃO
“De modo semelhante, erroneo e pernicioso à educação cristã é o chamado método da ‘coeducação’, baseado também para muitos no naturalismo negador do pecado original, e ainda para todos os defensores deste método, sobre uma deplorável confusão de ideias que confunde a legítima convivência humana com a promiscuidade e igualdade niveladora. O Criador ordenou e dispos a convivência prefeita dos dois sexos somente na unidade do matrimônio e gradualmente distinta na família e na sociedade. Além disso não há na própria natureza, que os faz diversos no organismo, nas inclinações e nas aptidões, nenhum argumento donde se deduza que possa ou deva haver promiscuidade, e muito menos igualdade na formação dos dois sexos. Estes, segundo os admiráveis desígnios do Criador, são destinados a completar-se mutuamente na família e na sociedade, precisamente pela sua diversidade a qual, portanto, deve ser mantida e favorecida na formação educativa, com a necessária distinção e correspondente separação, proporcionada às diversas idades e circunstâncias. Apliquem-se estes princípios no tempos e lugar oportunos, segundo as normas da prudência cristã, em todas as escolas, nomeadamente no período mais delicado e decisivo da formação, qual é o da adolescência; e nos exercícios ginásticos e desportivos, com particular preferência à modéstia cristã na juventude feminina, a qual fica muito mal toda a exibição e publicidade.” (Papa Pio XI, Encíclica Divini Illius Magistri, Ed. Escolas Profissionais Salesianas, 1938, p. 46)
As bases da doutrina contra a co-educação se firmam, pois, nas palavras do Santo Padre, que diz que Deus Nosso Senhor criou o homem e a mulher desiguais, para que se completassem perfeitamente por meio do matrimônio. A cada um dos sexos caberia um papel na vida de família e na sociedade e por isto se faz necessário que a educação de meninos e meninas seja também desigual. Portanto, a “igualdade niveladora” na educação, como diz Pio XI, é contrária aos desígnios de Deus para a família e a sociedade. Daí já decorre um grave defeito da co-educação nas escolas.
E, além do igualitarismo, há ainda o problema moral relacionado com a pureza e castidade. Como diz o Papa, a co-educação promove a promiscuidade entre os sexos, visto que a convivência entre os sexos se torna constante: no Brasil são pelos menos 6 horas de convívio comum, na ida para a escola, nas aulas, nos recreios, na volta para casa… É neste sentido que Pio XI diz que grande parte dos defensores da co-educação se baseiam num naturalismo que nega o pecado original, pois quem imagine que um convívio tão longo e próximo não apresente riscos para a pureza – quer seja por um contato sexual precoce e pré-matrimonial ou por uma influência malfazeja à práticas anti-naturais – só pode fazer pouco caso do ensinamento tradicional da Igreja tanto em relação ao pecado original e quanto à inclinação do homem ao pecado.
Sintetizando, Pio XI diz:
I) contra o igualitarismo: meninos e meninas são diferentes, portanto precisam de educação diferenciada;
II) contra a sensualidade: a proximidade excessiva entre os dois sexos degenera em promiscuidade;
III) a separação dos sexos na escola deve acontecer sempre que possível, mas principalmente no período da adolescência e nas aulas de educação física.
Vejamos agora o que dizem os moralistas católicos, começando pelas palavras do Dizionario di Teologia Morale de 1968, dirigido pelo Cardeal Roberti e revisto à luz do Concílio Vaticano II. No verbete Sexo pode-se ler:
“’O contato social entre pessoas dos dois sexos tem influência benéfica e educativa. Este contato o oferece, de uma maneira mais natural e equilibrada, a vida da família numerosa, na qual há pai e mãe e a prole quase sempre é composta de irmãos e irmãs. Um contato fora da família, demasiado grande e frequente, não está isento de perigos. Por isso, deve-se evitar tanto quanto possível a co-educação de jovens de sexo diferente nas mesmas escolas‘” (Dizionario di Teologia Morale, Ed. Studium, Roma, 1968, 4.ª ed., revista à luz do Concílio ecumênico Vaticano II, p. 1524-1525 / Imprimatur: Sac. Marius Iacovelli, Vic. Gen., Tibure, 25-2-1968 in A TFP: uma vocação, TFP e famílias, TFP e famílias na crise espiritual e temporal do século XX, Vol. I, elaborada por uma comissão de estudos da TFP, em fevereiro de 1986)
Este trecho repete o ensinamento do Magistério de Pio XI, acrescentando que a Igreja considera o contato social entre os dois sexos benéfico, desde que seja feito dentro do próprio ambiente familiar, entre pai, mãe, filhos e filhas. Como bem disse o Papa, a convivência perfeita entre os dois sexos se dá no matrimônio, e menos perfeita que esta convivência vem logo abaixo a convivência dos filhos e filhas do casal no mesmo lar: convivência imperfeita, mas que é, para crianças e adolescentes, a que mais condiz com seu estado de desenvolvimento. Mas, para que este relacionamento seja ainda mais rico, o Cardeal reitera que contribui enormemente a prole numerosa: geralmente composta por meninos e meninas. Eis a sabedoria da Igreja!
No mesmo Dizionario, o Cardeal Palazzini, na época Prefeito da Sagrada Congregação para a Causa dos Santos, escreve:
“’Co-educação é a educação de meninos e meninas feita em comum com o fim de favorecer um pretenso encontro natural e progressivo entre os dois sexos.
‘Além dos propugnadores do naturalismo e de alguns protestantes, que julgaram encontrar na co-educação um elemento favorável para a sanidade dos costumes em contraposição aos perigos do auto-erotismo, tal método tem sido elogiado também por alguns católicos. Estes têm sustentado ver nele uma forma de imunização gradual contra o mal, um incentivo para a gentileza e a emulação e uma expressão análoga à vida de família.
‘Porém a Igreja tem-se declarado constantemente contrária a tal método, porque tem visto nele um grave perigo para a pureza e para a formação dos jovens. Com efeito, a comparação com a vida familiar é claramente forçada, e uma vez mais se abusa na aplicação do princípio da imunização produzida pelo hábito (‘ab assuetis non fit passio’), esquecendo- se de que o hábito pode eliminar o choque da impressão nova, mas não elimina, pelo contrário aumenta o perigo proveniente do contato contínuo, constituindo um estímulo natural para as paixões, não só pela novidade, como também por seu conteúdo. E a experiência só faz confirmar a observação‘” (Cardeal Pietro Palazzini, in Dizionario di Teologia Morale, Ed. Studium, Roma, 1968, 4.ª ed., revista à luz do Concílio ecumênico Vaticano II, p. 323 / Imprimatur: Sac. Marius Iacovelli, Vic. Gen., Tibure, 25-2-1968 in A TFP: uma vocação, TFP e famílias, TFP e famílias na crise espiritual e temporal do século XX, Vol. I, elaborada por uma comissão de estudos da TFP, em fevereiro de 1986)
O Cardeal aponta para os argumentos dos co-educadores. Notemos que, curiosamente, são os mesmos argumentos do Dr. Uchôa no século XIX. Os argumentos seriam:
a) O contato entre os sexos favorece a convivência natural (o mesmo ponto 1 do Dr. Uchôa);
b) O contato entre os sexos evita certas práticas anti-naturais [auto-erotismo];
c) O contato entre os sexos incentiva a gentileza e representa a vida de família, preparando os jovens para a vida futura (o mesmo ponto 3 do Dr. Uchôa);
Ao que o Cardeal Palazzini opõe os seguintes contra-argumentos:
a.1) A convivência frequente entre os sexos elimina o choque da novidade, porém aumenta o perigo de pecado, incitando as paixões inferiores;
b.1) Decorrente do que se disse acima, as práticas anti-naturais só tendem a aumentar;
c.1) A comparação com a vida de família é evidentemente forçada, apenas visando justificar a posição da co-educação;
Por fim, citemos – ainda no Dizionario – a posição do Professor Carlo Rizzo, livre-docente de Clínica de enfermidades nervosas e mentais na Universidade de Roma:
“’Um dos corolários desses deletérios princípios – de Hirschfeld, criador da teoria do terceiro sexo, que seria o sexo do homossexual – é a promiscuidade sexual: mal que à primeira vista pode parecer sem gravidade, mas que, de fato, se torna frequentemente pernicioso já que pode constituir facilmente a premissa, a ocasião e o incentivo para aqueles males já mencionados – [homossexualidade, amor livre, neo- maltusianismo, etc...]
‘A todos é notório como a prudente separação entre os jovens e as jovens, que existia até há alguns decênios, praticamente desapareceu atualmente.’” (Prof. Carlo Rizzo, in Dizionario di Teologia Morale, Ed. Studium, Roma, 1968, 4.ª ed., revista à luz do Concílio ecumênico Vaticano II, pp. 1525-1526 / Imprimatur: Sac. Marius Iacovelli, Vic. Gen., Tibure, 25-2- 1968 in A TFP: uma vocação, TFP e famílias, TFP e famílias na crise espiritual e temporal do século XX, Vol. I, elaborada por uma comissão de estudos da TFP, em fevereiro de 1986)
Duas coisas chamam a atenção neste trecho: a primeira é que, mesmo que inconscientemente, os defensores da co-educação – promovendo a promiscuidade sexual – se aproximam dos princípios de pensadores como Magnus Hirschfeld, que defendia a tese de que haviam três sexos, sendo que homens e mulheres tinham diversas características em comum, não podendo ser taxados inflexivelmente enquanto seres do sexo masculino e feminino, e a síntese destes constituiria o indivíduo homossexual, que estaria numa posição intermediária entre os dois seres. Deste modo, os homens não são homens, as mulheres não são mulheres e os homossexuais representam os dois primeiros: no fundo, uma teoria do bissexualismo e da androginia. Portanto, não haveria mal algum em se colocar meninos e meninas na mesma classe, visto que no fundo todos são iguais. E, de uma maneira ou de outra, é isto o que reproduzem os co-educadores quando dizem que meninos e meninas têm as mesmas aptidões, as mesmas capacidades para diferentes coisas, e propõem o ensino em comum.
E o segundo ponto que chama atenção é o alerta dado pelo prof. Rizzo: a separação entre os sexos praticamente desapareceu; ou seja, estamos num ambiente abertamente influenciado pelas teorias igualitárias e anti-naturais de estudiosos como Sigmund Freud, Hirschfeld e outros, e ao mesmo tempo afastado da influência benigna e santificante da Igreja Católica.
Considerações finais à luz da doutrina católica sobre os pontos em favor da co-educação
A primeira e mais importante consideração a se fazer é que os defensores da co-educação passam completamente por cima de todo e qualquer argumento moral, dando a impressão de que o ponto central da discussão é de nível exclusivamente intelectual e/ou econômico. Em verdade, no ponto 5 o Dr. Uchôa tece, veladamente uma crítica ao argumento moral, taxando-o de preconceituoso e retrógrado, que deve dar espaço à racionalidade do ponto de vista dos co-educadores. Como costumeiro nos meios positivistas e progressistas, o Dr. Uchôa deixa a cargo da experiência e do tempo a extinção dos posicionamentos dos moralistas escrupulosos. Ou seja, o processo evolutivo da sociedade se encarregará de fazer desaparecer qualquer elemento ultrapassado, pois esta seria a verdadeira marcha da história e da humanidade: o progresso indefinido, atropelando sempre os costumes e crenças do passado. Mas, poderíamos pergunta, porque a doutrina católica será ultrapassada e os ideais dos co-educadores, velhos já de mais de 200 anos, podem continuar os mesmos? Como exemplo podemos ver que os argumentos listados pelo Cardeal Palazzini em 1968 são os mesmos dados pelo Dr. Uchôa em 1882: então, só as ideias positivistas não serão nunca ultrapassadas?
O professor Plinio Corrêa de Oliveira, fundador da TFP – Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade – no jornal Legionário de 1943 escreveu artigo intitulado “Co-educação” em que trata de analisar alguns dos pontos aqui discutidos. Ele diz que “(…) o problema consiste em saber se realmente os adversários da co-educação têm fundados motivos para sustentar sua tese. Em caso afirmativo, não há economia que compense os desastres da co-educação”. (2)
Portanto, seguindo o esquema do Dr. Uchôa, tudo depende do seu ponto 5, que é onde ele apresenta a religião como sistema velho e dominado por escrupulos. Se realmente existir um problema moral, e de fato existe – como já comprovado pelas citações do Magistério, moralistas e cientista colocadas acima -, vantagem econômica nenhuma pode justificar a manutenção de um sistema que põe em risco as almas de milhões de crianças e adolescentes: deste modo, o ponto 4, que apresenta o argumento econômico deixa de ter razão de ser.
Então, como podemos ver, todos os pontos em favor da co-educação são contrários ao ensinamento perene da Igreja. Tanto assim, que na encíclica Divini Illius Magistri, Pio XI chega a proibir a frequência dos jovens católicos em escolas acatólicas, neutras e mistas (3). Como, infelizmente, “as circunstâncias de lugar e de tempo” (4) nos obrigam atualmente a ter os filhos matriculados em tais escolas, o mesmo Santo Padre já dizia que nestas ocasiões a frequência se faz tolerável, visto não haver outra solução imediata – mas, que os pais devem procurar as escolas menos danosas para a alma de seus filhos.
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(1) Fabiane Freire França – A Co-educação dos sexos na escola pública brasileira: 1870-1932, Universidade Estadual de Maringá;
(2) Plinio Corrêa de Oliveira – “Co-educação”, Mensário Legionário, nº 555, 28 de março de 1943;
(3) Papa Pio XI, Encíclica Divini Illius Magistri, Ed. Escolas Profissionais Salesianas, 1938, p. 52;
(4) Papa Pio XI, Encíclica Divini Illius Magistri, Ed. Escolas Profissionais Salesianas, 1938, p. 52.
Fonte: As Chamas do Lar Católico
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